Por: Diana Daste Marmolejo*, em “Olhares sobre Desenvolvimento Comunitário – 10 perspectivas do impacto gerado por grandes empreendimentos”**

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O debate sobre o impacto social e a responsabilidade das empresas e organizações sociais em medi-lo tem ganhado muita atenção, em parte, pela necessidade de resolver problemas críticos em contextos de escassez, em que é fundamental entender os efeitos dos investimentos realizados. Da mesma forma, a consciência das decorrências (diretas e/ou colaterais) causadas pela chegada de grandes empreendimentos nas comunidades originou reflexões sobre situações econômicas, sociais e ambientais que poderiam ser aproveitadas nas diferentes etapas de intervenção. Isso, em grande medida, resultou em demandas de sustentabilidade, o que exigiu novas abordagens, novas ferramentas e novas considerações para a implementação de paradigmas de avaliação mais abrangentes.

Sob uma perspectiva técnica, a avaliação social apoia a gestão e implementação de programas ou políticas, buscando otimizar os recursos investidos e obter ganhos sociais mais expressivos. É um processo estruturado que cria e sintetiza a informação necessária para reduzir o nível de incerteza na tomada de decisões. As avaliações também são importantes porque revelam efeitos colaterais e identificam fatores que possam afetar critérios de medição e os resultados globais das intervenções. Apesar de ser um conceito que busca a objetividade de resultados, seus conteúdos são suscetíveis à missão das partes envolvidas, ao tipo de organização que faz a avaliação e à definição de valor social adotada.

Existem duas grandes linhas de pensamento referentes a sistemas de avaliação orientados a quantificar ganhos sociais e a mitigar os impactos negativos das empresas na comunidade. A primeira linha nasce da oportunidade de incluir a comunidade nas análises de risco empresarial e desenha mecanismos para atenuar os efeitos negativos do mercado na sociedade. A segunda procura gerar valor compartilhado e propõe processos inclusivos na concepção, implementação e avaliação de programas. Vejamos algumas considerações sobre as duas linhas de pensamento:

Previsão de impactos para mitigar riscos

Na década de 1970, ante o incremento de megaprojetos de infraestrutura, brotou a preocupação por aliviar seus impactos nas comunidades locais. Isso deu origem às avaliações de impacto sob a forma de “Social Impact Assesments (SIA)”, uma técnica de avaliação prospectiva que identifica riscos sociais, resultantes de uma operação física ou comercial.

Os SIA abriram o caminho, incluindo questões socioeconômicas nos processos de tomada de decisão da indústria de macroprojetos, mostrando as vantagens de integrar as comunidades impactadas no planejamento de projetos e demonstrando como estas respondem com benefícios na sustentabilidade de sua execução.

Juntamente com os EIA (Environmental Impact Assessments; em português: Avaliações Focadas em Indicadores Ambientais), os SIA consolidaram-se como uma exigência de financiamento, em grande parte promovidos por organizações internacionais, com o objetivo de reconhecer os elementos pelos quais as empresas afetam as localidades. Em 2009, 66 instituições financeiras haviam adotado os Princípios do Equador como seu principal conjunto de indicadores para assegurar que os projetos financiados incluíam práticas de gestão social e ambiental (IAIA 2015).

Os SIA são um bom complemento às análises de custo-benefício que geralmente ignoram importantes segmentos populacionais por concentrar sua análise em indicadores puramente financeiros. O legado das empresas e os ganhos para as comunidades se definem a partir da criação de riqueza, de infraestrutura e a geração de emprego. Esse tipo de avaliação foi uma conquista histórica, por reconhecer os impactos dos negócios sobre as comunidades locais e, em algum grau, demandar a concepção de mecanismos para preveni-los ou aliviá-los. É uma estratégia de sustentabilidade que tem evoluído muito nas últimas três décadas: o que inicialmente foi aplicado de maneira superficial (apenas para cumprir requisitos formais), passou a facilitar diálogos mais substantivos e mais alinhados com as necessidades e as características das comunidades locais.

Avaliação de impactos na criação de valor social

Uma segunda tendência procura avaliar a criação de valor social, considerando os diferentes atores envolvidos nesse processo, a saber: empresas, fundações, ONGs, organizações multilaterais e/ou governos. No que se refere especificamente às comunidades impactadas, estas são reconhecidas como agentes ativos, motivo pelo qual se busca sua vinculação nas discussões e dinâmicas desenvolvidas. Exemplo disso são as Parcerias Locais Estratégicas (PLE), iniciativa do governo britânico para envolver a comunidade no desenho, gestão e governança dos serviços públicos. Os esquemas de Negócios Inclusivos fazem parte também dessa lógica.

No entanto, a medição do valor social representa grandes desafios para as diferentes partes. Dependendo da composição e missão institucional, os processos de avaliação priorizam objetivos diferentes. Como tendência geral, as avaliações do setor público buscam legitimar os gastos públicos. A avaliação do setor empresarial concentra-se em insumos para melhorar o desempenho e otimizar o retorno sobre o investimento. Os investidores procuram estatísticas sólidas que lhes permitam analisar seus investimentos a partir de fórmulas de mercado, de modo que a sua decisão será atraída por instituições que gerem e possam fornecer essas informações.

Essa multiplicidade de interesses, juntamente com as peculiaridades nas diferentes cadeias de valor, reforça a importância do diálogo para resolver três necessidades estratégicas na concepção de indicadores e metodologias de trabalho que demonstrem o retorno do investimento e os ganhos estratégicos com as ações sociais:

  1. A necessidade de alinhar as métricas sociais com indicadores financeiros de desempenho.
  2. A necessidade de dar maior ênfase à transparência e à definição de responsabilidades claras.
  3. A necessidade de desenvolver processos mais eficientes para coletar e gerar dados.

Essa tendência alinha as diferentes partes interessadas nos processos de medição e prestação de contas, o que permite um diálogo transparente entre elas, além de ganhar eficiência na coleta e análise de informações. Trata-se de um avanço para o desenho de análises abrangentes que reflete a complexidade das questões sociais e reconhece os conflitos de missão entre os membros da cadeia de valor, desde os investidores até as comunidades impactadas. Reconhece ainda o fato de que as organizações não governamentais, programas de sustentabilidade e organizações de base (entre outras) são entidades de constituição diversa, que podem estar compostas por empresas que representam uma lógica econômica, comunidades com demandas sociais, conselhos de composição mista e fontes de financiamento 48 externo com agendas particulares. Portanto, não é raro que os requisitos das empresas mantenedoras ou de empresas de auditoria ou certificação entrem em conflito com os resultados de programas no território. Essa tendência também reconhece que os termos de uma avaliação social, desenvolvida para o setor privado, não abrangem o tempo necessário para materializar uma mudança social e que, muitas vezes, os indicadores privados não refletem as necessidades ou as conquistas sociais. Harmonizar essas questões no planejamento e administração de indicadores reduz o uso de métricas que gerem conflito, ao considerar as diferentes demandas de gestão e reporte.

Maior ênfase na transparência e nas obrigações de cada uma das partes faz com que segmentos específicos ganhem responsabilidades de acordo com suas funções. Isso gera matrizes de papéis e responsabilidades que definem o escopo dos diferentes atores e os seus pontos de encontro, não só demarcando ações para o desenvolvimento de avaliações, mas também abrindo um processo transparente de prestação de contas em todas as fases do projeto.

Definições e desafios: o acordo sobre o que medir

O desenvolvimento de enfoques para coletar e gerar informações mais eficientes otimiza o desempenho da avaliação, enquanto gera insumos para medir impactos. Atualmente, as avaliações mais utilizadas são as de eficácia e as de desempenho. A avaliação de eficácia busca construir mecanismos e informações “verificáveis” para que os responsáveis possam analisar se um programa atingiu seus objetivos e como eles foram alcançados. É amplamente utilizada para medir o retorno sobre o investimento a partir da identificação de impactos e resultados dos programas avaliados. A avaliação de desempenho analisa a conformidade com os procedimentos estabelecidos e o funcionamento dos programas. Tanto a avaliação de eficácia como a de desempenho convivem na gestão de programas sociais, e identificar as suas diferenças é fundamental para a definição dos objetivos que orientam a coleta e análise de informação.

Todo ciclo de avaliação começa com objetivos claros e metas estratégicas, e é aí que surge uma questão central. O que queremos dizer com impactos, efeitos ou retornos sociais?
As avaliações de impacto social com uma lógica de mercado claramente procuram minimizar externalidades para obter operações lucrativas e a legitimidade do negócio. Pela sua natureza, as entidades de constituição diversa geralmente não têm está clareza. Um acordo sobre a noção de valor social é essencial para qualquer balanço social. A ausência deste lança o risco de se criar 49 diagnósticos isolados ou de se gerar recomendações sem nenhum impacto nos planos de ação.

Embora o conceito de valor social tenha sido apontado desde o início de 1900, ainda hoje não há um consenso sobre a sua definição. Isso em grande parte porque sua ideia central de valor representa uma dicotomia.
O dilema de calcular o “valor” em termos monetários ou em termos éticos é uma decisão que define a concepção e o desenho dos indicadores para medir o sucesso de qualquer intervenção. Uma discussão institucional sobre o tema é o primeiro passo para avaliar o retorno social sobre o investimento e o impacto deste nas comunidades e na sociedade.

* Diana Daste Marmolejo é cientista política pela Pontificia Universidad Javeriana, mestre em Desenvolvimento Social Aplicado pelo University College London. Tem ampla trajetória na direção de processos de planejamento, gestão e avaliação, especialmente de projetos de Responsabilidade Social Corporativa, programas de Desenvolvimento Internacional e políticas sociais e urbanas, com experiências na Europa, África e América Latina.

** Publicação, organizada pelo Instituto Lina Galvani, aborda o desenvolvimento territorial sob diferentes perspectivas, por meio de artigos ou cases assinados por especialistas e envolvidos com o tema, convidando à continuidade da reflexão. Acesse a versão completa online da publicação