Este mês, o ILG compartilha mais uma de suas experiências recheadas de aprendizados acumulados ao longo de seus 10 anos de atuação. Conheça e entenda o trabalho do ILG junto à comunidade de Betel (Paulínia, SP).

 

Misturada, diversidades e contradições

Localizado na Região Metropolitana de Campinas (SP) e a leste de Paulínia – maior polo petroquímico da América Latina –, Betel possui uma área de aproximadamente 50 km² e cerca de 2000 habitantes. Embora pertença à cidade com o 7º maior PIB do país e um alto Índice de Desenvolvimento Humano (IDH = 0,85) ainda guarda lacunas e demandas, que o torna socialmente vulnerável.

Esse bairro traz em sua história alguns marcos significativos. Até 1993, parte dele pertencia à cidade de Campinas e parte à Paulínia. Essa situação acabava causando constante insatisfação em seus moradores, pois apenas alguns podiam participar dos programas sociais oferecidos pela prefeitura paulinense, que são muitos e bem variados, abrangendo auxílio aos estudos, alimentação, moradia e transporte. Quando Betel foi totalmente incorporado a esse município, a questão também não se resolveu, já que continuou afastado do centro da cidade – a 5 km de distância – e à margem de tudo o que acontecia por lá.

Diferente de outros bairros de Paulínia, Betel não possui um centro de ação comunitária e nem programas sociais municipais específicos. A sensação que se tem é de exclusão. “O bairro aqui sempre foi muito esquecido, sempre ficou largado às traças”, relata Elias Ribeiro, um dos moradores.

Segundo maior centro industrial do município, com grandes empresas e um intenso tráfego de caminhões, Betel tem também se tornado região de investimentos em condomínios de alto padrão. Dessa forma, parte da população reside em sítios, parte em casas urbanas e outra, nesses condomínios. Os novos moradores colaboram com a expansão do comércio local e, curiosamente, também fazem uso de serviços públicos, como escola e posto de saúde.

Essa mistura faz de Betel um bairro eclético e peculiar, onde convivem grupos diversos, deixando ainda mais complexa e desafiadora a mobilização para a busca de melhorias na qualidade de vida da população.

 

 

Primeiras medalhas

Movidos pelo sentimento de exclusão e amor ao bairro, em 2005 alguns moradores se uniram em busca de melhorias e conseguiram viabilizar aulas gratuitas de karatê para crianças e adolescentes. A opção pelo karatê, além do interesse prévio das crianças, está pautada na sua filosofia de busca constante pelo aperfeiçoamento pessoal, contribuindo para a harmonização do meio onde está inserido, exigindo de seus praticantes dedicação, treinamento e disciplina. “Aprendi a ter concentração, segurança e mais confiança em mim mesma. E isso não só aqui no karatê, mas em outras coisas da minha vida”, conta Vitória Betold, 10 anos, participante das aulas.

No ano seguinte, por meio da Agenda 21 – instrumento de planejamento participativo para o desenvolvimento sustentável -, a comunidade manifestou o desejo da criação de um centro de esporte e lazer em Betel. O grande sonho é ter um espaço reservado para o convívio social e a prática esportiva.

Em 2007, a comunidade se organizou e criou a Associação de Moradores de Betel e Alvorada Parque (AMBAP). Em seguida, as aulas de karatê ganharam o apoio da Galvani e se transformaram no primeiro projeto da AMBAP, o Viva Betel. O projeto tem como objetivo integrar os moradores por meio de atividades esportivas e culturais para crianças, adolescentes e seus familiares. “A Galvani foi a primeira que acompanhou, que viu a nossa luta, a nossa responsabilidade, a maneira como a gente trabalhava. E acreditou”, relatou Sueli Manfrim, coordenadora de projetos da Associação.

No decorrer dos anos, os alunos do karatê passaram a participar de competições, apresentando um excelente desempenho, chegando a ficar entre as melhores equipes da região e ganhando muitas medalhas – 99 até 2012. E o sucesso no tatame também começou a ser refletido na escola e na vida de cada criança: “O karatê ajudou muito meu filho, na questão dele ser uma criança tímida. Hoje, ele melhorou bastante, já superou essa timidez e acho que isso ajudou muito na escola também”, contou a mãe de um aluno. 

 

 

Transformando junto

O Instituto Lina Galvani começa a fazer parte dessa história em 2008, quando se aproxima do Viva Betel  propondo a ampliação da parceria para além do repasse financeiro ao projeto. Entendendo o fortalecimento das associações de base como premissa do desenvolvimento comunitário, passa a auxiliar a AMBAP na gestão, relacionamento com parceiros e conquista de novos recursos.

Dessa forma, ao longo dos anos de parceria, a Associação foi aumentando sua rede de apoiadores, ganhando mais independência e autonomia no desenvolvimento de seus projetos.  Encerrou o ano de 2012 com 10 organizações parceiras e um aumento de 50% nos recursos financeiros, advindos de fontes diversas – empresas privadas e leis de incentivo. “No bairro onde eu morava, nunca tinha visto nada nem parecido. Vocês estão de parabéns pela união!” declarou Marlene Gomes, nova moradora do bairro.

João Victor de Oliveira Peres, aluno do Viva Betel demonstra orgulho e alegria de morar no bairro: “Eu adoro morar em Betel! Gosto das aulas de karatê, jazz e temos espaço para campinho de futebol e muito mais. Espero que eu nunca me mude, para não ter que deixar os amigos que eu fiz aqui.”

 

 

Tecendo a Rede Social de Betel

Com o intuito de ampliar a participação nas ações de desenvolvimento comunitário, fortalecendo-as e tornando-as mais genuínas e sustentáveis, o ILG iniciou um movimento para a constituição de uma rede social solidária na comunidade de Betel.

As primeiras articulações estão sendo feitas entre as empresas instaladas no bairro, com o objetivo de ampliar o diálogo sobre a comunidade e fomentar o engajamento.

“Pudemos conhecer o mapeamento que o ILG já fez do bairro e quais as principais carências apresentadas pela comunidade. Além disso, é uma forma das empresas também apresentarem sua visão e discutirem como contribuir para o desenvolvimento do Betel e de que maneira isso pode representar uma troca entre as fábricas da região e a população”, declara Elisabete Altheman, gerente de recursos humanos da InVivo-NSA, uma das participantes da iniciativa.

A união de todos esses esforços é bastante positiva e a comunidade só tem a ganhar: novos projetos de melhorias para o bairro, novos atores engajados, novas possibilidades de arranjos. E quem sabe o grande sonho da construção de um centro de esporte e lazer no bairro não possa virar realidade?