Conhecendo o terreno

Serra do Salitre é mais um daqueles pequenos paraísos escondidos entre as montanhas de veludo de Minas Gerais. Apesar do nome, sua maior riqueza não é o salitre – essa denominação veio da crença de que existe na vizinhança águas minerais que se julgavam carregadas dessa substância e que poderia substituir o sal para o gado –, mas as lindas paisagens, as pessoas simpáticas e acolhedoras, a terra fértil, o café e o queijo, e as reservas de fosfato.

E foram essas últimas que atraíram a empresa Galvani para investir na região.

Os moradores de Serra já tinham ouvido falar de que a Galvani abriria uma unidade no município. E as expectativas em torno da notícia eram muitas. Diferente do que aconteceu em outras localidades, em Serra, o ILG iniciou o seu trabalho antecipando-se à chegada do empreendimento. Realizou rodas de conversa com a comunidade, que acabaram apontando os primeiros temas relevantes para a população: falta de perspectiva para a juventude e o potencial turístico inexplorado da região.

O início das atividades da empresa no município precisou ser adiado, mas o ILG manteve contato e realizou algumas ações ligadas aos temas levantados. Foram realizadas, em 2011 e 2012, duas oficinas voltadas aos jovens: vídeo e fotografia. Ambas com foco na valorização e divulgação das riquezas locais.

E o ILG alcançou esse objetivo, como mostra o depoimento de uma participante da oficina de vídeo, Kátia Gomes: “Adorei esse projeto e foi uma grande iniciativa, com certeza vão aparecer vários outros que vão favorecer nossa cidade e também a empresa.” A aluna do curso de fotografia, Letícia Finetti declarou: “Moro aqui e nunca tinha percebido que dá para ser um lugar aproveitado por sua beleza. O modo como a gente saiu para olhar a cidade foi diferente.” E Thalita Menezes, que também fez a mesma oficina completou: “Hoje vejo o quanto Serra pode proporcionar momentos de prazer a nós que moramos aqui e também àquelas pessoas que buscam um pouco de paz em meio a essa vida tão agitada.” Letícia, Thalita e muitos outros conterrâneos puderam enxergar Serra com outros olhos.

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Identificando as melhores ferramentas

No final de 2011, é criada a área de Sustentabilidade na Galvani e a empresa identifica o desenvolvimento local como estratégia fundamental para o negócio. A nova área desenha uma agenda de sustentabilidade e forma um grupo de trabalho que define uma matriz de responsabilidades e papeis de cada um dos envolvidos no que tange o desenvolvimento socioambiental e relacionamento com comunidades, bem como uma estratégia diferenciada de atuação para cada uma das localidades.

Serra do Salitre foi escolhida como piloto para implantação dessa estratégia e com esse alinhamento, surgem novos desafios para o ILG, como a construção de uma agenda de futuro e o trabalho junto às prefeituras municipais.

Envolvendo moradores, lideranças e outros atores locais em sua criação, a agenda de futuro é um documento que tem como finalidade buscar o desenvolvimento da região de uma maneira mais sustentável e organizada, além de guiar possíveis investimentos sociais.

Mauro Escriboni, vice-prefeito de Serra, por exemplo, disse que recebeu o convite para participar desse processo e não teve dúvidas de que daria a sua contribuição: “Achei o projeto muito interessante, senti que beneficiaria a população e fui levar minhas opiniões”.

Já Eduardo Lana, empreendedor, também trouxe uma bela justificativa para se envolver: “Sou filho da Serra, a história de meus familiares muitas vezes se mistura ao crescimento e desenvolvimento da cidade. Estou cansado de ver aqui o que vemos em toda parte deste país. A minha principal motivação é tentar, de certa forma, mudar pra melhor a realidade do município e das pessoas que aqui residem”.

E Reginaldo Pereira Dornelas, aluno da Escola Estadual de Serra do Salitre demonstrou orgulho por fazer parte dessa construção: “Me sinto importante quando sou convidado a participar de um projeto tão importante pra minha terra”.

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Semeando o futuro

Para que se tivesse uma primeira visão da localidade, os moradores foram convidados a pensar nas riquezas que já possuíam, que seriam a base, as raízes para a construção dos sonhos. E o modo de vida característico da cidade, o espaço público e as relações são os elementos mais valorizado por todas as faixas etárias.

Em seguida, sustentados por esses ativos, os desejos de cada participante para Serra foram brotando como as folhas de uma grande árvore.

Tudo isso foi inserido no mapa da cidade, sendo que os sonhos e desejos foram agrupados em grandes temas: emprego, habitação, lazer, cultura, esporte, saúde, turismo, educação, meio ambiente.

Esse processo aconteceu por meio de encontros abertos ao público, com a participação de crianças, jovens e adultos, estudantes, comerciantes, agricultores, professores, empresários, operários, dos diferentes bairros, incluindo a Zona Rural. Em paralelo, algumas lideranças – representantes da prefeitura, câmara municipal, da polícia civil, de empresas, comércio, associações de classe, líderes religiosos, entre outros – também foram entrevistadas. Para Flávia Lemes, da consultoria Dobra, que conduziu o processo junto ao ILG “foi muito importante ter um grande número de pessoas de perfis diversos, desde o poder público a cidadãos dos 8 aos 63 anos, para alcançar um amplo panorama na pesquisa”.

Mariney da Silva Ribeiro, que já foi Secretária da Educação e atualmente é Diretora da Escola Estadual de Serra do Salitre, colocou que “fazer parte da construção da Agenda de Futuro para meu município foi colocar um sonho em pratica, discutir, trocar ideias, planejar juntos, com mais certeza de que realmente podemos esperar que mudanças irão acontecer em um futuro próximo”.

O mais interessante foi perceber que não só os adultos ou jovens sonham com melhorias na cidade. Dois alunos do ensino fundamental, de apenas 11 anos, compareceram em um dos encontros, por um acaso ou mesmo por curiosidade, e manifestaram diante de todos seus anseios para a região. Isso sem contar os desejos vindos dos participantes dos encontros específicos para as crianças na Escola Estadual Serra do Salitre, Escola Municipal Dalila e na Escola Aquarela.

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Escolhendo as mudas

Na segunda fase, os principais temas e subtemas que haviam sido definidos foram apresentados para a população e um novo desafio foi proposto: determinar quais dos temas seriam prioritários para Serra do Salitre e quais teriam maior impacto na comunidade. Houve também um levantamento das iniciativas e projetos que já estavam acontecendo ou estavam previstos para acontecer na localidade. Em conjunto, os participantes elegeram como áreas mais urgentes o meio ambiente, a saúde e o emprego, divididas em diversos subtemas relacionados.

“Trabalhar com o sonho de cada um é complicado e, ao mesmo tempo, muito necessário. Quando se pega os sonhos de uma criança e de um idoso, por exemplo, eles são bem distantes uns dos outros. Mas vimos que a grande maioria tem sonhos comuns. E são esses que acredito que devem ser o gancho que temos que trabalhar, completou Acrísio da Silva Rocha Júnior, conhecido como Juninho, microempresário da região, que também participou ativamente do projeto.

O passo seguinte foi traçar com os participantes os caminhos necessários para solucionar as questões levantadas. Entre as propostas sugeridas estavam: a busca de recursos financeiros, mobilização da juventude, criação de um espaço comunitário e formação de parcerias. Para validar essas ações e legitimar a Agenda, mais pessoas e de diversos setores foram envolvidas. Além disso, as ideias foram distribuídas em ações de curto, médio e longo prazo.

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Plantando os sonhos

Para que as ações começassem a sair do papel, os participantes foram divididos em comitês. O Juninho, por exemplo, escolheu encabeçar um projeto ligado ao turismo, por acreditar ser mais abrangente: “De certa forma, ele é uma junção de todos os sonhos que apareceram, porque dentro do turismo pode-se trabalhar a melhoria de vários setores dentro do município, desde educação e geração de divisas até a formação de grupos de artesãos e criação de empregos. E para receber os turistas, também é necessária uma melhoria no comércio, na infraestrutura e na saúde.”

Mas a Marta, a Nina, o Rafael, a Alessandra ou a Carmem se envolveram em outros projetos, de acordo com os temas pré-estabelecidos, os desejos, habilidades e interesses de cada um.

Juntos, os participantes fizeram o exercício de imaginar o que diriam sobre Serra após 10 anos trabalhando para colocar a agenda em prática: “No ano de 2014, o nosso progresso era pouco e a participação de seus moradores escassa, mas com a conscientização da comunidade, neste ano de 2024, a nossa cidade evolui dentro do idealizado. Nos vemos numa cidade organizada, onde há emprego, educação e saúde. Vemos também a natureza recuperada, a evolução do progresso e todos se responsabilizando pelo seu desenvolvimento, num sistema organizado”.

E uma percepção do Mateus Ribeiro da Silva, jovem participante da oficina de fotografia, lá em 2012, onde ainda não se planejava construir uma agenda de futuro, se mantém viva e pulsante: “Boas ideias vêm dos mais variados tipos de pessoas e idades. E a melhor maneira de coloca-las em prática é por meio de projetos que envolvam mais a população”.

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Primeiros Frutos

No início de 2015, a Agenda de Futuro de Serra do Salitre foi apresentada a toda a cidade. O evento contou com cerca de 80 pessoas, entre moradores da comunidade, poder público, funcionários da Galvani, empresários, jovens e educadores e foi importante para todos terem uma visão das diferentes demandas para o desenvolvimento de Serra do Salitre.

“Ficou claro que ter esse espaço frequente para debates e reflexões nessa construção traz motivação, criticidade e um senso de pertencimento e apropriação da cidade relevantes para uma longa caminhada”, observou Sergio Kuroda, Gerente de Desenvolvimento Comunitário do ILG. O próximo passo é a realização de duas oficinas: uma com o tema Redes Associativas e outra sobre Desenvolvimento de Projetos com os representantes dos comitês criados e outros moradores que desejem participar.

Eduardo considerou a apresentação, o momento mais marcante do processo: “olhar para a agenda pronta depois de tanto trabalho, um trabalho árduo, de formiguinhas, onde várias pessoas se uniram em busca de um objetivo”. Porém, ele complementa dizendo: “acredito ter chegado a hora em que vou ser mais útil, colocando a mão na massa, correndo atrás da realização do que foi proposto”.

E ele não está errado. A construção da agenda de futuro de Serra do Salitre foi apenas o primeiro passo. A expectativa de todos os envolvidos é que, cada vez mais, novas pessoas se unam a essa busca de melhorias para a região. Mariney faz o convite à população serralitrense: “vamos juntos fazer valer as ideias e planos que muitos de nós contribuímos e colaboramos!” O Juninho complementa: “Espero o melhor de tudo isso que sonhamos juntos. Que as pessoas se deem as mãos, vejam a necessidade de fazerem parte do processo e acreditem nesses sonhos”. E assim, a grande árvore do futuro de Serra do Salitre começará a gerar frutos.

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