Eles estão na linha de frente do trabalho de desenvolvimento comunitário que realizamos nos municípios. São nosso elo mais próximo com os moradores e, inclusive, fazem parte da comunidade e conhecem a fundo a realidade local, fator que contribui para atuarmos de forma mais precisa de acordo com as características próprias de cada região e de seus moradores. Eles são os agentes locais do Instituto Linha Galvani. Nesta edição do Frutos, temos uma entrevista especial com Cristina Cardoso, que atua em Serra do Salitre (MG), José Filho, de Campo Alegre de Lourdes (BA), e Thaís Malta, de Luís Eduardo Magalhães (BA). Eles nos contam sobre sua experiência como agentes locais, o papel que desempenham e as realizações que esse trabalho proporciona.

Agentes Locais (da esq. para dir.): Cristina Cardoso (Serra do Salitre – MG), José Filho (Campo Alegre de Lourdes – BA) e Thaís Malta (Luís Eduardo Magalhães – BA)

Na sua opinião, qual a importância de ouvir a comunidade por meio dos processos participativos?

Cristina: Eu vejo os momentos de diálogo, de escuta da comunidade, como um dos processos mais importantes da metodologia do Instituto. O nosso trabalho só vai ter sentido se ouvirmos, de fato, o que os moradores querem. Quando promovemos as rodas de conversa e ouvimos as pessoas sem julgamento, sem crítica, além de descobrirmos se o que nos propomos a fazer na comunidade faz sentido, criamos um vínculo com os moradores. Aí, sim, eles acabam vendo mais sentido no nosso trabalho, conhecem melhor o que o Instituto faz e o que podemos construir juntos. A escuta é uma etapa que dá mais transparência ao nosso trabalho.

José Filho: A importância é muito grande, porque, a partir do momento que ouvimos a comunidade, entendemos quais são suas dificuldades e o que está surtindo efeitos positivos ou até negativos. Dessa forma, conseguimos atuar de uma forma mais precisa de acordo com os anseios dos moradores. A escuta ativa permite um diálogo sem interferência externa. São eles mesmo falando de suas dificuldades e desejos e nos pautando para trabalhar essas questões que nos apontam. Participando do processo ativamente, a comunidade passa a ter um senso de pertencimento maior e mais vontade de atuar partindo daquela necessidade que é dela.

Thaís: O interessante é que nas rodas de conversa, principalmente, os moradores não apenas apresentam os problemas locais, mas também as possíveis soluções. Com isso, sentem-se mais participantes, envolvem-se no processo, colocam a mão na massa e tornam as soluções mais duráveis, pois adquirem um cuidado maior por aquilo que está sendo feito.

José Filho, a esquerda, participando de encontro com as comunidades em Campo Alegre de Lourdes com Valéria Lapa, gerente de Relacionamento Institucional e Comunidades.

O que mais o processo de escuta acrescenta para o trabalho no Instituto?

Cristina: Ele traz a identidade daquela comunidade. Cada território é único, tem suas próprias características. Então, quando paramos para ouvir os moradores, temos uma visão melhor do que pode dar certo ou não na localidade. É um diagnóstico completo da cultura local, do modo de vida das pessoas, dos valores da comunidade.

Qual a contribuição de ter um agente local que faz parte da comunidade?

Cristina: Um agente local da comunidade já conhece as pessoas e a realidade da região. Isso é muito importante pois ajuda em todo o processo e contribui para abrir as portas para a atuação do Instituto. É verdade que o papel que assumimos tem seus altos e baixos, porque, ao mesmo tempo que somos o Instituto, somos a comunidade, então temos que equilibrar bem esses papéis.

José Filho: Tem seu lado positivo e negativo. De um lado, conhecemos a realidade local e as pessoas com mais profundidade. Do outro, justamente por essa razão, acaba sendo mais difícil ter um olhar distante. Temos uma preocupação maior sobre qual o momento de olhar de perto ou de longe as atividades e processos desenvolvidos na comunidade. Mas ser da comunidade nos ajuda muito no trabalho, desde a forma de falar com os moradores a entender a cultura local. Isso, inclusive, diminui os riscos de desenvolver determinadas ações que nós, por antecedência, já sabemos que não fazem parte do perfil da localidade.

Cristina Cardoso, no centro, durante a exposição Memórias de Setembro, um iniciativa do Comitê de Mobilização de Serra do Salitre com o apoio do Instituto.

Para você, o que significa o trabalho que realiza de desenvolvimento comunitário?

Cristina: É um desafio, porque lidamos com muitas expectativas. Ao mesmo tempo, é bom estar ali como uma pessoa que pensa e tenta fazer algo pela transformação da comunidade. Eu sou professora, com mais de 10 anos de experiência na educação, e estar no meio de pessoas, fazer os contatos, conversar, ouvir e provocar nos moradores novas atitudes é uma satisfação para mim. Acredito que é uma grande oportunidade que o Instituto me dá e proporciona uma enorme realização pessoal. Por meio desse trabalho como agente local, consegui extrapolar o ambiente escolar e envolver outras pessoas, mobilizar, construir amizades. Consegui ver as pessoas se realizarem e melhorarem a auto estima. Hoje, vejo como um projeto de vida essa preocupação com o mundo, com o coletivo. Percebi que a educação não precisa estar ligada apenas ao ler e escrever, podemos ensinar as pessoas a se transformarem, acreditarem em si mesmas e buscarem melhorias para a sua comunidade.

José Filho: Para mim, é uma satisfação imensa saber que estou contribuindo para o desenvolvimento da minha comunidade e das pessoas que nela vivem. Recentemente, fizemos uma dinâmica na qual tínhamos que imaginar o caminho que trilharíamos nos próximos quatro anos. Chegando no fim do percurso, tínhamos que olhar para traz e resumir essa trajetória. Para mim, tudo estava traduzido na frase: “Valeu a pena!”.

Thaís: É muito gratificante. A gente acompanha desde o início a identificação dos problemas na comunidade e os meios para solucioná-los. Então, quando vemos resolvido é muito bom! Aqui em Luís Eduardo Magalhães, por exemplo, fizemos esse ano o mutirão para reforma de uma praça e, hoje, quando passamos por ela e vemos as pessoas usufruindo do espaço, é muito recompensador. Também há o fato de que ser um agente comunitário nos dá um olhar diferente sobre a localidade. Passamos a ver mais a fundo não apenas os problemas, mas suas causas e tudo o que está pro trás deles, gerando novos questionamentos e experiências.

Thaís Malta com as crianças plantando mudas durante o mutirão da Praça do Jardim dos Ipês, em Luís Eduardo Magalhães.

Tem algum fato ou depoimento que mais te marcou nessa trajetória?

Cristina: Certa vez, em uma roda de conversa, uma senhora falou que a vida dela tinha acabado depois da aposentadoria, mas, ao participar das ações do Instituto, fez amizades, passou a se sentir novamente útil em poder contribuir e descobriu que pode repassar um pouco de sua sabedoria de vida para outras pessoas. Estar no meio de pessoas de várias idades, participar e ter as reuniões mudou a vida dela e a motivou novamente. Isso toca muito a gente! É um dos resultados mais efetivos que vejo no nosso trabalho.

José Filho: Um depoimento me marcou profundamente foi o de um senhor que disse que que, a partir do momento que começou a fazer parte da Rede Social, sua vida melhorou 100%. Tanto nas questões relacionadas à saúde física quanto em auto estima e aprendizados. Relatos como esse me deixam muito contente!

Thaís: Recentemente, levei duas pessoas da comunidade para participar do evento Dialogando, em São Paulo. Nenhuma delas conhecia a cidade e uma nunca havia andado de avião. Foi muito legal que o Instituto proporcionou para eles essa oportunidade, que foi transformadora. Pessoalmente, também foi marcante para mim participar do curso de terapia comunitária, no qual pude entender a função das rodas de conversa e o quanto é importante ouvirmos o próximo.