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Criar um espaço de diálogo para refletir sobre a questão do lixo e do descarte em locais inapropriados, além de caminhos para melhorar a vida na comunidade e criar áreas de convivência. Foi com esse objetivo que o Instituto Lina Galvani iniciou no ano passado o projeto Rua Viva, na comunidade do Jaguaré, em São Paulo. A ideia partiu da constatação de uma área de descarte irregular de lixo e entulho, por isso a questão da educação ambiental é um de seus principais focos. Especialista nesse setor, o Instituto Reinventar tornou-se um grande parceiro do projeto, com atuação em todo o processo e nas três edições do Rua Viva realizadas até agora. Na entrevista desse mês, conversamos com a pedagoga Roseli Barbosa, sócia do Instituto Reinventar e da ONG Espaço Urbano, sobre a atuação da entidade na comunidade do Jaguaré e a importância de projetos como o Rua Viva para a comunidade.

405956_199721540158287_544316056_nComo a Reinventar trabalha a questão do descarte de resíduos na comunidade do Jaguaré e como foi o caminho até chegar ao Rua Viva, em parceria com o ILG?
Somos uma consultoria ambiental que trabalha desde 2008 no bairro do Jaguaré. Já vínhamos identificando dentro da comunidade que, além da falta de um sistema de coleta seletiva, não havia uma preocupação com os resíduos que eram jogados na rua. Era um impacto que percebíamos. A gente falava de educação ambiental com as crianças, mas, quando saíamos do portão para fora da empresa, a Bunge, víamos que a própria comunidade não se apropriava desse conhecimento de educação ambiental.
Então, em 2010, resolvemos sair da empresa e também ir para a comunidade para identificar qual era o principal problema. Percebemos que há vários pontos de descarte irregular, que voltam a ser ocupados após o recolhimento feito pela prefeitura. Mas por quê isso ocorria? Como resolver? Para responder a essas perguntas fizemos um processo de diagnóstico, nos juntamos à Loga, que atua na coleta de lixo, em um projeto de capacitação para jovens como gestores do meio ambiente, e à ONG Benfeitores Jaguaré, para identificar a problemática fazendo entrevistas com essas pessoas.

Quando começou na comunidade o Recicle Mais e Pague Menos, que vocês apresentaram na primeira edição do Rua Viva?
Por volta de 2014, começamos a trazer o programa Recicle Mais e Pague Menos. O programa propõe a troca de lixo reciclável por descontos na cona de luz, e foi uma forma que conseguimos, a partir do diagnóstico, fazer com que a comunidade tivesse algum benefício com o resíduo que levasse. Na Reinventar, sempre acreditamos que os resíduos têm que estar ligados à geração de renda, de uma forma que a pessoa tenha um retorno com a venda ou troca ou beneficie alguém. Hoje, a coleta seletiva de São Paulo não explica essa possibilidade para as pessoas. É feito o recolhimento do reciclável, mas não se conta que essa ação pode beneficiar uma cooperativa, que o lixo pode voltar para produção ou que a coleta ajuda a preservar o meio ambiente. Então as pessoas não veem o porquê de descartar corretamente.

De que forma trabalhar a conscientização?
A gente preza que não adianta ir apenas no foco do problema, que seria o resíduo na rua, temos que ver mais amplamente o que está por trás. Com o Recicle Mais e Pague Menos, começamos a ver que as pessoas tinham uma aderência rápida ao projeto. Hoje, temos o recolhimento de uma tonelada ao dia no bairro do Jaguaré, mas ainda é pouco. Ele ainda não alcança todas as comunidades, e as pessoas acabam não levando porque o valor do desconto por quilo ainda é baixo para motivá-las a sair da suas casas e andar alguns quarteirões para depositar os resíduos. Para orientá-las, começamos novamente a pensar que ação poderíamos fazer na rua. Foi aí que encontramos o Instituto Lina Galvani, que dividiu conosco a problemática séria da comunidade sobre o resíduo descartado incorretamente na região da empresa. Veio então a oportunidade de tratar desse foco educacional que estamos pensando desde 2008 dentro da comunidade.

O que foi realizado nessa área nas três edições do Rua Viva?
Propomos para o ILG esse foco da educação ambiental e começamos a pensar em oficinas que pudessem atrair o público e também mostrar que aquele resíduo pode ser transformado. No primeiro encontro, levamos o Recicle Mais e Pague Menos, para que as pessoas pudessem ser cadastradas no programa. Além disso, promovemos uma oficina de brinquedos com resíduos. Foi bem interessante, pois as crianças se apropriaram tão rapidamente dos brinquedos que até colocaram nome nos pés de lata e nos bilboquês feitos de garrafa descartável! Alcançamos também as mães, mostrando o quanto seus filhos gostavam de brincar com aquilo que seria “lixo” e foi transformado em brinquedo. Na segunda ação, falamos sobre as várias doenças que o descarte incorreto pode provocar. Uma delas, em particular, é mais preocupante hoje em dia: a dengue. Então, levamos o vaso anti-dengue, no qual o mosquito não tem acesso à água, e também apresentamos alguns repelentes naturais, para a proteção contra o mosquito. E tudo isso sempre relacionando com o descarte correto dos resíduos. Na última ação do Rua Viva, falamos sobre o plantio em garrafas pet, além de montarmos um estande de brincadeiras, como nas outras edições. Nós acreditamos que se as crianças se conscientizarem e estiverem inseridas dentro desse processo de educação ambiental, elas levam para casa a informação transmitida, tornam-se não apenas motivadoras, mas também multiplicadoras.

Como foi a receptividade da comunidade do Jaguaré?
No começo sempre fica aquela dúvida se as pessoas vão aceitar a proposta, principalmente por ser algo na rua, com oficinas e conversas neste espaço público. Mas já na primeira edição os moradores fecharam a rua, ajudaram, participaram e mostraram interesse no projeto. Eles revelaram que queriam uma atitude como essa, que sabem da problemática que há no descarte irregular dos resíduos e que é preciso resolvê-la. Foram super receptivos, inclusive as crianças – mais de 50 já na primeira edição! Várias pessoas da comunidade vieram, deram sugestões e, hoje, já temos um grupo de pessoas que querem trabalhar com a gente e estão apropriados da problemática. Isso é essencial: o entendimento de que o público é de todos e deve ser cuidado por todos. Por isso que essa ação em parceria com o ILG é muito importante.

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