A capoeira como instrumento para melhorar a qualidade de vida dos cidadãos, fortalecer os vínculos de união na comunidade e até ser um caminho para ensinar a história do Brasil que não está nos livros. É nisso que acredita o professor Alex Alcântara de Souza, do povoado de Angico dos Dias, no município de Campo Alegre de Lourdes, na Bahia. Ele foi um dos contemplados do edital Ideias e Ações, promovido pelo Instituto Lina Galvani, para apoiar projetos transformadores nas localidades nas quais atuamos. Alex reuniu seus conhecimentos nessa arte e a vontade de contribuir com a comunidade no projeto Ação Brasil Artes Integradas. Com foco principal na capoeira, a iniciativa vem fazendo sucesso em Angico dos Dias não apenas com os alunos, seu público-alvo, mas também com outras faixas etárias e, inclusive, o grupo da Terceira Idade. Na série de entrevistas especiais que marcam os 15 anos do Instituto, conversamos esse mês com Alex sobre sua iniciativa e os resultados que vem alcançando:

Desenvolvimento do projeto

Já conseguimos alcançar sucesso nos três principais objetivos do Ação Brasil Artes integradas. O primeiro era trabalhar a integração do grupo, unir as pessoas da comunidade e fazer com que cada uma enxergasse seu próprio valor. Essa é a base primordial de tudo. O próximo foi aplicar a técnica da capoeira em si. E o terceiro era fazer com que a comunidade colaborasse com a gente com a questão da educação e que o trabalho pudesse fluir e dar certo. Felizmente, já chegamos lá. Conseguimos motivar alguns alunos que estavam há anos afastados da escola, resgatá-los e fazer com que voltassem às classes. As parcerias que fizemos com os dois colégios locais, tanto do Ensino Médio quanto do Fundamental, estão dando certo. As aulas e o comportamento dos alunos melhoraram, assim como a integração entre eles: muitos viviam na mesma comunidade, mas não tinham nenhum vínculo de amizade e aquele espírito de viver em sociedade uns com os outros. Depois desse projeto, as coisas fluíram. Hoje, já estamos com 80 participantes – e tem cada vez mais gente chegando! Nem eu esperava que fôssemos chegar a essa proporção.

A importância da capoeira

A capoeira é uma arte que impõe disciplina. Quando a pessoa não a conhece, às vezes, pode ter uma visão distorcida. Mas quando tem contato, vê o valor e a função dela. A capoeira pode proporcionar saúde, integração e qualidade de vida. Por meio dela, também estudamos a história do Brasil, que passa por essa arte. São histórias que não estão nos livros e que podemos passar para os alunos.

O outro passo que integra na capoeira é a musicalidade. Eles gostam muito da parte de canto e das aulas com os instrumentos. E também há dinâmicas que a gente faz com outros jogos, como a roda da laranja, que ensina o valor da partilha. Funciona assim: eles disputam uma laranja no jogo de angola (a primeira modalidade de capoeira que chegou no Brasil). O aluno que conseguir pegar aquela fruta na disputa do jogo vai descascá-la e, se aprendeu tudo o que falamos sobre partilhar, dará um pedacinho para cada um. Isso para que todos ali não se sintam perdedores, mas vitoriosos. É a ideia de partilha em si. É uma prática importante porque vivemos em um mundo no qual as pessoas só veem as coisas para si próprias, não se importam com o outro.

Nós temos que passar valores para essas crianças porque, de fato, elas serão o futuro do nosso país. Para acabar com a corrupção e a violência, por exemplo, temos que conscientizá-las sobre igualdade social e justiça. Dessa forma, teremos um país muito melhor e mais feliz. Eu acredito que é através de projetos como esses que o Instituto Lina Galvani vem implantando que as coisas vão fluir. A transformação começa com a gente!

Capacitações do Edital Ideias e Ações

O mais marcante em todas as capacitações e atividades que fizemos foi ver como a comunidade de Angico dos Dias interagiu e participou. Foi emocionante sentir que todo mundo se juntou em prol de algo e saiu perfeito. Um exemplo é a radionovela que fizemos na oficina de Educomunicação. Teve o dedinho de cada um, todos colaboraram e conseguimos passar uma imagem muito boa. Não existe nem palavras para descrever o quanto foi bom! E tenho certeza que essa sensação não é só minha, pois todos destacaram a integração que teve nas capacitações e dinâmicas realizadas. Lembro particularmente de uma atividade na qual todos estavam “embaralhados” e tinham que buscar uma saída em conjunto para desatar aquele “nó”. Essa dinâmica me marcou porque pude ver que, não importa a situação – seja no trabalho ou na vida pessoal -, se todos pensarem no mesmo objetivo podemos atingir o que esperamos. Isso é o resultado de confiar no outro para dar opiniões e também estar aberto para recebê-las.

Novas parcerias

Tive o prazer de levar meu projeto para outros públicos além dos alunos. O grupo Diversão Não Tem Idade me convidou para fazer uma palestra e dar aulas de capoeira adaptada para o pessoal da Terceira Idade. Foi marcante! Acredito que consegui passar a alegria para eles, que ficaram muito motivados. Nós brincamos, dançamos, tocamos berimbau e violão. Acho que levantou a autoestima deles.

Aula de capoeira adaptada aos integrantes do Diversão Não Tem Idade

Também penso em trabalhar com outros grupos no sentido de unir a comunidade. Porque se estamos todos juntos – não apenas a turma da capoeira, mas os que participam do Edital, as escolas, a comunidade e os grupos -, faremos, realmente, um trabalho comunitário e social. Queremos envolver toda a comunidade de uma maneira em geral, principalmente a Terceira Idade, que é uma classe que vinha sendo esquecida. Nosso grupo tem essa meta de mostrar que o corpo envelhece, mas a alma e a mente estão jovens para brincar, criar e inovar. É preciso dar essa injeção de ânimo! Os idosos são nosso exemplo de vida.