Seu Jonas Fernandes da Silva exibe com orgulho seus produtos. As ervas medicinais que há décadas tratam males dos moradores do povoado de Angico dos Dias, no município de Campo Alegre de Lourdes, na Bahia, agora estão em nova roupagem. Ganharam embalagens, rótulos e até logomarca – que seu Jonas faz questão de levar adesivada no lado esquerdo do peito. E é mesmo com o coração feliz que ele vê algo que fazia informalmente, com base em um conhecimento herdado pela vida, transformar-se em produto vendido em uma das barracas da 4ª Feira da Rede Social de Angico, Peixe e Região, realizada nos dias 13 e 14 de outubro.

A concretização das Ervas Medicinais Seu Jonas, o nome oficial da nova marca, reflete com maestria o espírito de profissionalização que marcou essa edição da feira desde o seu planejamento. Com o auxilio da consultora Petrina Santos, da Ageeo, os participantes da Rede Social fizeram um trabalho prévio de curadoria dos itens que levariam para o evento. O objetivo era que todos representassem a essência principal que dá nome à feira: Sabores e Saberes.

Com esse conceito em mente, os grupos socioeconômicos formados pelos moradores selecionaram os produtos mais representativos: os quitutes típicos preparados pelo Doce Como o Sertão, as peças desenvolvidas à mão pelo Flor do Sertão, a massa e o bolo de puba feitos pelos participantes do Horta Esperança. E teve ainda uma barraca da própria Rede Social, que congregou todos os grupos e ofereceu receitas que já deliciaram gerações, como o bolo de garfo, a brevidade e a canjica salgada.

“Todos os grupos trabalharam com esse alinhamento de valorizar os sabores e saberes locais, com os itens típicos e produtos que carregam parte da história da comunidade, como as ervas medicinais que o Seu Jonas fazia para distribuir para as pessoas e, agora, estão estruturadas como um produto que estreou na feira. Foi realmente especial”, diz Petrina.

VISÃO DE NEGÓCIO

O fortalecimento da identidade local foi um marco nessa edição da feira, mas não o único. Ela também foi considerada o ponto de partida para o projeto de criação de um Fundo Social Rotativo, a ser gerido pela comunidade. “Essa edição é um divisor de águas, porque os grupos socioprodutivos e a Rede Social encamparam o desafio de fazer um verdadeiro plano de negócios para o evento, um planejamento completo começando com a pré-produção, passando pela execução, até a contabilização de receita versus os gastos”, diz Patricia Limeres, coordenadora de Relacionamento Institucional e Comunidades do Instituto Lina Galvani. “Isso dá um sentido de pertencimento e internalização de como funcionará o Fundo a partir dessa primeira experiência em diante”, completa.

Considerar a feira como um negócio profissionalizou suas etapas de realização. Os organizadores estabeleceram um roteiro para os dois dias de festa, com horários bem definidos para as atividades culturais, como as apresentações de reisado e de ginástica laboral e os shows de forró pé de serra, arrocha e rock. Eles também estabeleceram uma série de parcerias que contribuíram para o equilíbrio econômico da feira. Todos os grupos musicais, incluindo representantes de cidades vizinhas, caso de São Raimundo Nonato e Caracol, apresentaram-se sem custos. “Além disso, os participantes da Rede Social visitaram empresas e comércios locais pedindo apoio para a realização do evento”, conta José Filho, agente local do Instituto. “Acredito que conseguimos plantar essa sementinha da cooperação e das parcerias, essenciais para fazer tudo acontecer”, diz Petrina.

PROJETO PILOTO

O modelo de negócios desenvolvido para a feira apresentou algumas novidades importantes, como a exigência de uma contribuição dos expositores e a criação da barraca da Rede Social, montada com a colaboração de todos os grupos socioecômicos e cujo lucro volta diretamente para o Fundo Rotativo, que financiou o evento.

O conjunto de iniciativas deu resultado. “Foi a primeira edição que alcançou o equilíbrio entre despesas e faturamento”, diz Petrina. “É uma quebra de paradigma muito importante, pois indica que os próximos eventos tendem a ter resultados financeiros positivos”, completa.

O sucesso da feira também abalizou o formato do Fundo Rotativo, que pode ser replicado em outras ações da Rede Social. “Foi o pontapé inicial e nos deu uma experiência que, com certeza, vai ajudar nos próximos projetos que realizarmos. Quem sabe até podemos levar a feira para outras comunidades e ampliar nossos mercados!”, planeja Rosa Maria Ribeiro da Mata Rocha, participante da Rede Social.