“A gente precisa conhecer primeiro, antes de agir”. O ensinamento de Dona Lina Galvani inspira a fase inicial da metodologia de desenvolvimento comunitário que utilizamos nas localidades nas quais atuamos. Seguimos suas sábias palavras à risca. Antes de partir para a ação, é necessário conhecer os moradores, ouvi-los, mapear sua realidade, descobrir as inquietações, desejos e sonhos. E foi justamente isso que fizemos, desde o início do ano, nas comunidades de Baixão Novo, Baixãozinho e Baixão Grande, em Campo Alegre de Lourdes, município da área do polígono da seca, na Bahia.

I Roda de Conversa Baixões e Angico (2)

1ª Roda de Conversa com os povoados dos Baixões.

A região não é uma completa desconhecida para o Instituto. Desde 2009, atuamos no povoado de Angico dos Dias, no mesmo território, realizando e dando apoio a uma série de projetos em parceria com a comunidade. É o caso da Rede Social de Angico, Peixes e Região, criada há mais de 5 anos, responsável por um processo de transformação social. Com o trabalho em Angico já sedimentado, chegou a hora de ampliar a atuação no território. Para isso, realizamos as primeiras etapas da nossa metodologia nos chamados “Baixões”:

Pesquisa de percepção

Praticamente todos os moradores das localidades foram entrevistados e responderam a um questionário que nos ajuda a coletar os principais indicadores utilizados pelo Instituto para nortear os projetos de desenvolvimento comunitário. A pesquisa revelou um dado muito promissor: numa escala até 10, o índice de confiança dos moradores alcançou a média 9,6. Isso indica que eles já têm arraigado um forte senso de comunidade, considerando que confiam uns nos outros e acreditam que podem contar com uma rede de solidariedade local.

No outro extremo, a pesquisa de percepção também mostrou que as famílias têm baixo índice de satisfação com relação à situação atual de atendimento a áreas importantes, como educação, saúde, cultura e lazer, sentindo-se desassistidos pelo Poder Público.

“Todos os indicadores que levantamos nos ajudam a ter uma panorama atual das comunidades. Daqui a dois anos, uma nova pesquisa é feita e poderemos comparar os dados e analisar a evolução dos índices e, consequentemente, o reflexo do nosso trabalho na região”, explica Tatiana Mischan, gerente Corporativa do Instituto.

II Roda de Conversa Baixoes e Angico (3)

2ª Roda e Conversa com os Baixões.

Rodas de conversa

Quase 100 moradores participaram das três rodas de conversa que realizamos nos “Baixões”, com a presença de jovens, adultos e idosos e distintos perfis, tornando o grupo bem representativo da comunidade. Nos dois primeiros encontros, o foco foi levantar as principais necessidades locais e traçar o diagnóstico participativo. Entre as demandas levantadas pelos moradores estão as relacionadas a investimentos em educação e ao acesso à água para a criação de caprinos e ovinos. Também ganharam destaque os temas relacionados a emprego e geração de renda, principalmente a criação de mais oportunidades para os jovens, para evitar que tenham que buscar alternativas de trabalho em outras localidades.

Planejamento participativo

Após o levantamento das necessidades mais latentes para a comunidade, chegou a hora do próximo passo: o planejamento participativo. Para esse momento, contamos com presença dos moradores de Angico dos Dias na terceira roda de conversa. Eles enriqueceram o encontro com a experiência de quem já trilhou um caminho consistente em projetos de desenvolvimento comunitário e tem uma visão das características encontradas no território. “Nas colocações que fizemos, contamos sobre nossas experiências, conquistas e até dificuldades que tivemos pelo caminho. Passar todo esse nosso conhecimento para eles é muito importante”, diz Jorene Soares Barbosa Rocha, da Rede Social.

Na etapa do planejamento participativo, vamos em busca dos sonhos que os moradores têm para o local onde vivem e da construção, em conjunto, de planos para tirá-los do papel. Na região dos “Baixões”, a principal frente de trabalho identificada gira em torno da criação de oportunidades para o surgimento de empreendimentos locais. Áreas como a reciclagem e a criação de animais podem ser alternativas para alcançar esse objetivo, atreladas à melhoria de conexão de internet e ao acesso à educação, essenciais para dar suporte a projetos de geração de trabalho e renda e consequente retenção dos talentos locais.

III Roda de Conversa Baixoes e Angico (3)

3ª Roda de Conversa com os Baixões e Angico dos Dias.

Força conjunta

A participação dos moradores de Angico dos Dias nesse processo contribui não apenas por conta de sua experiência, mas também porque possibilita pensar em projetos que envolvam todas as comunidades. “A ideia é juntar esforços, potencialidades e oportunidades para ver o que conseguimos construir juntos na região, inclusive otimizando investimentos”, diz Cecília Galvani, diretora executiva do Instituto.

“Acredito que a parceria da comunidade de Angico com as dos Baixões pode gerar muitos projetos bons pela frente. Sabemos que há um longo caminho a ser percorrido e tem dificuldades, mas estamos motivados com as possibilidades”, completa Jorene

Passos seguintes

Os próximos meses serão intensos para as comunidades e a equipe do Instituto Lina Galvani. Estamos na fase de formação dos grupos de trabalho e de planejar as capacitações para tirar as ideias do papel, criar os projetos e partir para as etapas de elaboração de orçamentos, busca de parcerias e demais ações necessárias para concretizar os sonhos levantados nas rodas de conversa. Tem mais: até o fim do ano, faremos uma convocação pública convidando as pessoas a submeter projetos com foco no desenvolvimento do território. As melhores propostas serão selecionadas para receber apoio.

O desafio é grande, mas as características da localidade certamente ajudarão nesse processo. “Encontramos uma comunidade extremamente coesa, com um índice grande de confiança, representatividade e diálogo. Percebemos que é um território bastante fértil em termos de união, de força de vontade e de comprometimento. Tudo isso facilita o engajamento e a mobilização em torno de um sonho comum”, diz Cecília.